11.28.2007

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O equilibrista desapegado foi ontem às compras e, na mesma prateleira da cidra, encontrou uma promoção especial de fim de ano: motivação a 3 por 2. Quis economizar pois ouviu boato que em janeiro, embora um pouco avariadas, as motivaões vão estar mais em conta ainda. Voltou pra casa só com três pacotes de sal grosso.

Ele, nesse final de ano, está tomando a contra-mão da corda bamba. Está se apegando, encontrando nortes e encarando a vida a longo-prazo, tudo o que sempre esteve no cantinho daquela unha que nunca desencravava. Mas ele não respirou aliviado nem saiu pra comprar um chinelo de dedo. Tem uma outra unha latejando latejando latejando. Qual é?.

Ele acha melhor começar a acreditar nos intervalos comerciais.


(...)

Uma cidade, sim. Edificada
nas nuvens, não — no chão por onde vais,
e alicerçada, fundo, nos teus dias,
de jeito assim que dentro dela caiba
o mundo inteiro: as árvores, as crianças,
o mar e o sol, a noite e os passarinhos,
e sobretudo caibas tu, inteiro:
o que te suja, o que te transfigura,
teus pecados mortais, tuas bravuras,
tudo afinal o que te faz viver
e mais o tudo que, vivendo, fazes.

Uma cidade
onde possas cantar quando o teu peito
parecer, a ti mesmo, ermo de cânticos;
onde posssas brincar sempre que as praças
que percorrias, dono de inocências,
já se mostrarem murchas, de gangorras
recobertas de musgo, ou quando as relvas
da vida, outrora suaves a teus pés,
brandas e verdes já não se vergarem
à brisa das manhãs.

Ai de um amor assim, vergado ao vínculo
de tão amargo fado: o de albatroz
nascido para inaugurar caminhos
no campo azul do céu e que, entretanto,
no momento de alçar-se para a viagem,
descobre, com terror, que não tem asas.

É tempo. Faze
tua cidade eterna, e nela habita:
antes que venham ventos, e te levem
do peito o amor — este tão belo amor
que dá grandeza e graça à tua vida.

Tiago de Melo

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